Na semana passada comentei aqui sobre Suíte Tóquio, propositalmente sem marcar muito minha opinião, porque achei que talvez fosse importante ser mulher, e preferencialmente ser mãe, para poder analisar o livro com mais propriedade. De lá pra cá, ouvi opiniões bem contrastantes de mães que ou gostaram muito do livro ou que preferem outras leituras, vamos dizer assim. Vai ver a literatura não exija tantas credenciais e a gente possa opinar sem tanta cautela.
Outra coisa que mencionei no Sinto Muito #29 foi sobre A Mulher da Casa Abandonada, podcast que citei como um correlato temático do livro da Giovana Madalosso. Pensando melhor, acho que vale a pena destacar essa produção pelo fenômeno que ela tem virado nas redes sociais (e consequentemente no mundo real) e a ironia que isso representa. Antes do programa em que apura a história da mulher que vive na decadente mansão em Higienópolis, o jornalista Chico Felitti apresentou o podcast Além do Meme, em que investigava justamente histórias que se tornaram sensações na internet, como a mulher que fingiu estar grávida de quadrigêmeas ou o garoto que estrelava num vídeo de bar mitzvah ao som de uma paródia de One Direction. Para esta quarta-feira está programado para ir ao ar o último episódio de A Mulher da Casa Abandonada, mas eu já fico curioso aguardando Felitti tratar da repercussão do próprio podcast num futuro próximo.
Já nos comentários que meus amigos fizeram sobre meu texto anterior, o Sinto Muito #28, da Bienal do Livro de SP, os comentários foram mais homogêneos. Ficou parecendo que só eu não sabia que se tratava de um evento bastante comercial e bastante voltado a adolescentes e leitores do que o Prêmio Jabuti chama ensaboadamente de literatura de entretenimento. Para meu alívio, achei uma reação parecida com a minha em um vídeo do Ferréz (de quem falei lá no Sinto Muito #2), inclusive bem mais vocal do que eu.
Ainda antes, no Sinto Muito #27, comentei sobre o ótimo Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, e não coube encaixar naquela mensagem uma associação que me veio à mente assim que li o título do filme pela primeira vez, com a canção “Welcome to the internet” (Bem-vindo à internet) do comediante americado Bo Burnham, parte do repertório de seu especial Inside, lançado pela Netflix no ano passado. O negócio é que nessa música o Bo se refere à internet como “Um pouquinho de tudo o tempo todo”.
Agora em 2022, no aniversário da obra, que veio a se tornar seu maior sucesso ao falar das agruras do isolamento social com humor autodepreciativo e autoconsciente, Burnham lançou em seu canal do Youtube outro vídeo de mais de uma hora, chamado The Inside Outtakes, um catadão de sobras do filme original, que não chega a acrescentar grandes coisas mas tem curiosidades bacanas do processo de produção e uma ou outra pérola que não entrou no original, como o final alternativo em que ele reflete - de forma esperançosa - sobre aquele medo da quarentena, de estarmos perdendo a vida, através do que talvez seja a fórmula mais batida de piada: Por que a galinha atravessou a rua?
É uma boa pedida especificamente para quem gostou muito de Inside, e me lembrou um pouco o aproveitamento de material que o Radiohead fez no aniversário de 20 anos de seus discos, que comentei no Sinto Muito #11.
Para não pular o Sinto Muito #26 nessa ladeira cronológica que estamos rolando abaixo: Encontrei um artigo com desenhos de rascunho do Edward Hopper, pintor que inspirou o livro de Katia Marchese de que tratamos nessa edição. Muito interessante de ver como algumas coisas mudam do esboço inicial para as pinturas em tela, e mesmo como os desenhos isolados já são obras com uma força própria.
Já no Sinto Muito #25 eu falei sobre a série Broad City, que eu estava recomeçando a ver e tinha acabado de completar a primeira temporada. Agora já terminei a quarta e penúltima, e essa já foi produzida em 2016, ou seja, sob o governo Trump. Tem um episódio que me chamou muita atenção, no qual a personagem Ilana, sempre muito desinibida e curiosa sobre formas variadas de sexo, confessa não conseguir ter um orgasmo há meses. Começa a recapitular e percebe que seu problema dura desde o dia da eleição.
Claro que é tudo apresentado comicamente, mas chega a ser tocante pensar nisso agora, que estamos a beira de completar quatro anos de uma desgraça análoga (até pior). Viver num país atolado nessa lameira é para brochar qualquer um, e se estamos aqui tentando falar de arte, encontrar algum prazer para gozar a vida, é por sermos subversivos. Essa também foi mais ou menos a minha leitura do disco Delta Estácio Blues da Juçara Marçal, no Sinto Muito #8.
Eu poderia ir voltando mais e mais para trás, porque a cada semana que eu mando um texto aqui eu tenho a oportunidade de ouvir outras interpretações sobre o que eu comentei, receber referências e opiniões que me fazem ver tudo com outros olhos, mais atentos do que antes.
Quis escrever um pouco sobre as edições anteriores porque esta já é a trigésima e eu sou meio fraco para números redondos. Será que um dia a gente chega no Sinto Muito #100? Não sei, mas estou contente de ter chegado em 30. Se você se diverte com essas abobrinhas que eu falo aqui e quiser ajudar, tenta pensar em alguém que pode se interessar também e manda o link do Sinto Muito pra essa pessoa se inscrever. Um dos motivos de ter cada vez mais gente se interessando por newsletters é que ninguém aguenta mais ficar dependendo de algoritmo do Mark Zuckerberg para falar com os outros, e o melhor contraponto é a boa e velha divulgação boca a boca.
Estaremos aqui lembrando de mais coisas.